PARIS, 09 Set 2013 (AFP) - Nada de símbolos religiosos nas escolas, nada de proselitismo em sala de aula: a França passa a adotar a partir desta segunda-feira em suas escolas públicas a 'Carta da Laicidade', em um país que discute há anos o lugar da religião na República.
O uso do véu islâmico nas escolas, ou do solidéu, da estrela de Davi ou da cruz, ausência dos alunos durante o Ramadã, o Eid ou o shabbat, embate entre as teorias da evolução das espécies e crenças sobre a origem divina da vida na Terra: estas questões são expostas regularmente, enquanto o Islã se torna a segunda maior religião na França, 'filha mais velha da Igreja'.
A laicidade é uma 'batalha que não opõe uns aos outros, mas uma batalha contra aqueles que querem opor uns aos outros', declarou nesta segunda-feira o ministro da Educação, Vincent Peillon, ao instalar a primeira carta em uma escola na região de Paris.
A Carta, que tem um valor simbólico e não jurídico, lembra em 15 pontos os princípios fundamentais da lei de 1905, segundo a qual 'a República laica organiza a separação entre religião e Estado. O Estado é neutro no que diz respeito a crenças religiosas ou espirituais '.
A Carta também faz referência a uma lei de 2004 que proíbe 'o uso de apetrecho ou vestuário pelo qual os alunos manifestam abertamente sua filiação religiosa'.
Em 4 de dezembro de 2012, o Comitê de Direitos Humanos da ONU pediu a França para rever esta lei, depois de tomar conhecimento da expulsão do colégio de um aluno que usou um turbante sikh.
Aprovada por unanimidade, esta lei encerrou cinco anos de um debate apaixonado. Em 1989, três estudantes foram excluídas de uma instituição em Creil (norte), porque se recusaram a tirar seus véus na sala de aula. O caso tomou uma dimensão nacional.
'Nenhum estudante pode alegar crença religiosa ou política para contestar o direito de um professor de ensinar uma questão no programa', afirma ainda a Carta.
Em algumas escolas, as controvérsias surgiram a respeito de aulas de Biologia sobre a reprodução ou a teoria da evolução, ou de História quanto ao nascimento das religiões ou o Holocausto.
A Carta não atraiu grande oposição.
'Eu sou ateu. Acho um absurdo que as pessoas cheguem à escola com símbolos religiosos. Eles não precisam mostrar a todos. Se são crentes é um problema deles, não nos diz respeito', opina Arthur Rivelois, de 16 anos, estudante em Paris.
A Carta? 'É bom que todo mundo tenha conhecimento', acredita Elsa, de 15 anos, encontrada em frente ao mesmo colégio de Turgot em Paris.
Sua amiga Bariza afirmou que apesar das leis, 'os alunos continuam a mostrar símbolos religiosos, com grandes pingentes, com a cruz ou a estrela de David. Existem aqueles que não irão respeitar a Carta'.
=== Islã se sente alvo====
Os diretores terão de afixar a Carta em um local 'visível a todos', de preferência em 'áreas de acolhimento e de passagem', e realizar reuniões com os pais, avisa o ministro da Educação Vincent Peillon.
Sua 'missão' é 'não apenas lembrar as regras que nos permitem viver juntos no ambiente escolar, mas também ajudar as pessoas a entender o significado dessas regras', disse o ministro, em uma carta aos diretores.
Responsável por uma associação de pais, Valerie Marty lamenta que a Carta é omissa sobre outros temas espinhosos, particularmente em torno de 'árvores de Natal ou da cantina'. Às vezes, 'fazem um escândalo, porque há peixe na cantina na sexta-feira', disse.
A oposição mais direta veio do presidente do Conselho Francês da Fé Muçulmana, Boubakeur: '90% dos muçulmanos vão se sentir alvos desta Carta, enquanto que em 99% dos casos eles não representam problema algum à laicidade'.
'Por que lembrar a lei de 2004 que proíbe símbolos religiosos visíveis nas escolas?', questionou. 'Há também um apelo pela igualdade de gênero...'
'Peillon jurou que a comunidade muçulmana não é o alvo desta Carta. Mas o inferno está cheio de boas intenções', conclui Boubakeur.
Na extrema direita, Marine Le Pen chamou a Carta 'de uma medida midiática, longe de lidar com o problema real', denunciando 'o desenvolvimento preocupante do comunalismo e das reivindicações político-religiosas'.
E o partido de esquerda do radical Jean-Luc Mélenchon considera que a Carta não passa de 'um chamariz pra distrair das condições lamentáveis do ensino'.
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